Após doações de dentistas, ela deixou de ser chamada de “monstro”; veja

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“As pessoas me chamavam de monstro, e meus amigos diziam que eu não conseguiria fazer o tratamento. Hoje, eu sou uma nova mulher, mais feliz”. O desabafo é da atendente Luciene Anselmo de Faria, de 30 anos, ao completar um mês da cirurgia que reconstruiu seu maxilar em Santos, no litoral de São Paulo.

A história de Luciene, que morava em Peruíbe, também no litoral paulista, é acompanhada pelo G1 desde 2013. Ela nasceu com uma malformação e deficiência no crescimento da mandíbula, uma síndrome chamada pelos médicos de microssomia hemifacial. Ao procurar ajuda, dentistas se mobilizaram para oferecer um tratamento gratuito.

Por causa da aparência, ela conta que era ridicularizada na escola, e que nunca conseguiu encontrar um emprego para poder se sustentar. “Eu decidi procurar um médico quando minha então sogra falou para o meu ex-marido: ‘Para que, meu filho, tanta mulher bonita na rua e você arrumou justo ela, cheia de defeito?’”.

Luciene foi atendida, inicialmente, em uma associação, que a encaminhou ao cirurgião dentista Alessandro Silva, especializado em traumatologia buco-maxilo-facial. Ele verificou a gravidade do caso e a impossibilidade da paciente arcar com os custos. Com o ortodentista Marcelo Quintela, ele encontrou uma solução.

“Ela entrou no meu consultório, pela primeira vez, chorando, mas vimos que era possível fazer algo. Unimos profissionais e iniciamos o tratamento para preparar a paciente para a cirurgia”, conta Quintela. A partir de doações, foi possível bancar um plano de saúde a ela, com custo mensal aproximado de R$ 500.

A atendente precisou utilizar aparelho ortodôntico durante quase um ano e meio. “A mandíbula era para trás, e ela não tinha queixo. A cirurgia foi para corrigir a respiração, o selamento labial e a estética facial. E isso aconteceu”, explica Silva, que também teve ajuda do dentista americano David Poor.

Ao todo, 12 profissionais atuaram diretamente para a cirurgia acontecer. O procedimento ocorreu, sem qualquer eventualidade, há um mês em um hospital de Santos, e durou aproximadamente 11 horas. Duas próteses de titânio foram colocadas no lugar onde não havia ossos, para corrigir a articulação da boca.

“Eu estava tranquila, mas ansiosa ao mesmo tempo. Queria que acabasse logo, para eu ver como ficou. Ao final, eu não acreditei no que vi”, conta Luciene. Até quem não falava com ela queria ver o resultado da cirurgia. “Perto de casa, quando eu passava, as pessoas ficavam sem acreditar: ‘Nossa, como mudou'”.
Familiares também ficaram surpresos quando a viram pela primeira vez após a cirurgia. “Minha filha sempre foi minha parceira, sempre esteve comigo e cuida de mim. Ela virou para mim e me disse como eu estava bonita. Nossa, foi especial. A minha mãe também teve a mesma reação”, conta.

Em um mês, a vida dela mudou radicalmente. Conseguiu, pela primeira vez, um emprego como atendente em uma empresa de telefonia, e se mudou para o Rio de Janeiro. “Tudo é um começo, uma nova etapa. A gente fica meio assim de enfrentar, mas tem que enfrentar. Eu estou segura e me sinto aceita”, garantiu.

‘Monstro’

Luciene nasceu em Peruíbe, com a síndrome e sem uma das orelhas. Ao crescer, foi vítima de preconceito e bullying. “Era difícil, pois eu não era aceita pelas pessoas. Uma vez, eu coloquei batom nos lábios e me disseram que era para tirar, pois não era Halloween (Dia das Bruxas)”, lembra.

Dentro de casa, ela evitava fazer companhia às visitas e preferia ficar sempre no quarto.”Na escola dos meus filhos (ela tem dois, uma de nove e outro de sete anos), os amigos deles perguntavam porque eu tinha a boca torta. Falavam que a mãe deles não era assim e que era mais bonita que eu. Eles me defendiam”.

Após escutar o comentário da sogra, ela decidiu procurar ajuda, mesmo sabendo que não tinha condições para arcar com as despesas. Ao final de um evento em uma universidade, encontrou um palestrante, o dentista Wagner Nascimento, que a atendeu na associação. Foi quando tudo começou a mudar na vida dela.
Segundo os médicos, se tivesse que pagar pela cirurgia, ela teria que desembolsar entre R$ 50 mil e R$ 60 mil. “Eu não tinha dinheiro nem para os R$ 500 do plano, que poderia ser uma solução”. Por meio de doações ao Instituto Religar, após campanhas, ela teve as despesas custeadas. “Agora, eu quero curtir, fazer faculdade de Educação Física e viver uma nova vida”.

Tratamento

Alessandro e Marcelo se sensibilizaram com a história de Luciene e mobilizaram colegas. Verificaram que, para o caso, havia a necessidade de reunir especialistas de diversas áreas, para que pudessem ocorrer ao menos duas soluções: resultado clínico e funcional, que propiciasse, também, seu retorno à vida social.

“Inicialmente, tínhamos planejado fazer duas cirurgias. Mas verificamos que era possível fazer tudo em uma só ocasião. Com tudo pronto, trouxemos o colega dos Estados Unidos. Ele fez um lado e eu fiz o outro. Foi um sucesso”, conta Alessandro. Ele disse que se surpreendeu com o resultado “tão positivo”.
Marcelo também ficou contente. “A gente sempre soube que a Luciene é bonita. Nós tínhamos comentado isso. Como ela tem os terços superior e médio (partes superiores da face) bonitos, a gente restabelecendo o terço inferior, iria dar uma face harmônica. Mas a gente não imaginava que ia ficar tão bom e funcional”, confessa.

Luciene terá acompanhamento por, aproximadamente, mais um ano, inclusive com fonoaudiólogos. “É uma nova musculatura, que ela tem que se adaptar”, explica Silva. Nesse período, ela retornará a Santos para consultas. “Mas vamos buscar no Rio de Janeiro parceiros para cuidar dela lá também”, diz Quintela.

via G1

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